a triste constatação

se você é habitante da banda oriental desse mundo, então provavelmente passa uma boa parte do seu dia tendo que dar respostas. ninguém vai te incomodar ou te criticar se você tiver uma resposta na ponta da língua. resposta, satisfação, diagnóstico, culpados, resultado. a vida virou uma grande entrevista no estilo ping-pong. responda logo ou caia fora. pensar pra responder? nem pensar! mas por trás daqueles que exigem respostas com os dedos apontados no nosso nariz, existe um cérebro que vem perdendo a capacidade de fazer perguntas. pergunta-se qualquer coisa, responde-se qualquer bobagem e assim vamos vivendo a lógica iterativa da qual fala o artigo abaixo.

boas perguntas geralmente demandam um tempo para serem respondidas. interessante é que essa aparente demora muitas vezes evita uma série de perguntas e respostas que não levam a lugar nenhum. então por que não "perder" tempo pensando antes de formular uma pergunta? minha triste constatação é de que essa habilidade foi se atrofiando ao longo do tempo.

o prejuízo é grande. quem não é capaz de fazer perguntas, perde junto a capacidade de questionar a si próprio. e quem não se questiona em geral gosta de auto-afirmar [têm os que se anulam também]. pessoas auto-afirmativas costumam ser chatas, egocêntricas, auto-referentes, arrogantes e quiçá, nocivas. além disso, perguntas mal feitas baixam o nível de exigência das respostas. logo, vamos perdendo também a aptidão de formular boas respostas, mesmo que as perguntas sejam claras. muitas vezes isso fica evidente quando vejo programas de entrevista em que o entrevistado responde tudo menos o que foi perguntado, como se tivesse levado um roteiro que fosse obrigado a repetir com indiferença. não há diálogo, apenas non-sense em forma de entretenimento.

de uma perspectiva pessimista, imagino um futuro onde os avatares humanos já virão de fábrica sem o aminoácido do questionamento. o ponto de interrogação vai deixar de existir na gramática. só restarão as exclamações, e os homens-bonecos vão gritar, gritar, sem se preocupar se estão sendo ouvidos.

[inspirado parcialmente no artivo do post anterior]
[só posso falar um pouco da banda ocidental. tenho esperanças de que a banda oriental seja pelo menos um bocadinho diferente]

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